Reflexão
Data
Abril de 2024
Comunicação Ancestral
O que faz uma comunicação resistir ao tempo, às lutas e ao apagamento?
“A primeira forma de comunicação foi a pintura corporal”, disparou Macsuara Kadiweu ao chegar à plenária de comunicadores indígenas no Acampamento Terra Livre (ATL – 2024), com a percepção aguçada de sempre. Um dos primeiros atores indígenas do cinema nacional, se sente esperançoso com a nova leva de comunicadores que só aumenta entre os povos originários.
Mas o que faz uma comunicação resistir por mais de 4.000 anos? Atravessar mais de 500 anos de luta? Resistir como sentido de ato de resistência. Sem ceder nem sucumbir. A comunicação que resiste sem ser transmitida pelos detentores da voz – aqueles que detém o poder de contar histórias e chamar invasões de descobertas. Como se mantém?
Com olhar de aprendizes, estivemos no ATL para ouvir comunicadores indígenas sobre suas vozes ancestrais. Vozes que precisam romper barreiras para (re)conquistar territórios. Mais que isso, vozes que lutam para serem genuínas, diretas e autorrepresentadas.
Enquanto escutamos suas vozes, a comunicação indígena preenche o espaço. Não apenas a comunicação oral – ou escrita, tão hegemônica desde a colonização -, mas a comunicação plural e ancestral que resiste ao tempo e ao espaço.
Pinturas corporais, maracás, colares, cocares. Objetos, instrumentos, rituais, costumes. Em sincronias particulares a cada etnia, uma comunicação única em conceito e saberes toma os sentidos. Como arma, estratégia de sobrevivência, plena de sentido e propósito.
“Todo ato de comunicação é possível desde que tenha um propósito”, declarou Cris Tupan, da comissão Guarani Yvyrupa, durante a plenária Vozes Ancestrais, Conexões contemporâneas: A comunicação Indígena em perspectiva.
“A comunicação indígena tem que ser diferente, não podemos ser iguais. Temos nas nossas mãos a nossa história, temos que saber a história do nosso povo para que possamos ter uma base. Qual é a tua base? A comunicação indígena é diversa, é plural, é ouvida com o canto dos parentes, através dos rituais, das pinturas que nos diferenciam – pela comunicação visual sabemos de que região cada um é”. Ariene Susui, do povo Wapichana.
Saímos dessa experiência ouvindo a ancestralidade e reafirmando aquilo que nos move: a comunicação resiste quando tem propósito, quando é coerente e quando é genuína. Símbolos, ritos, sons e costumes se tornam passageiros quando são vazios de sentido, quando não enxergam o outro e quando não contam histórias. A comunicação precisa ser forte para nos fazer seguir adiante.
“Nossa comunicação é um ato de amor à terra e aos povos”, Cris Tupan.